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Literatura | Poesia | Aldo Jr
ALDO JR
Reta Final
terra molhada
& enfeites da natal
& versos que repito
um sol tentando escapar
pelos vãos dos dedos
do dia cinza
uma bigorna
sobre o ponteiro
que amanhece a segunda-feira
outro ano no retrovisor
& um pedra imensa
segurando os últimos dias
parece o fim
no entanto
tudo é cíclico
***
Corpos
Brutal
como um relâmpago
a riscar o céu
da noite morna
não há nada de bonito
nas janelas
- nem nas da alma
- nem nas da rua
cicatrizes que fervilham
sob o sol de janeiro
e corações que tropeçam
ao contar os dias
tudo amontoado
no canto mais úmido
do quarto
que não é mais nosso
***
Espelho
O que sobrou depois
Que o orgulho partiu-se em cacos afiados
Na parede da razão?
O que sobrou depois
Que a arrogância escorreu feito sangue fresco
Pelo ralo da certeza?
O que sobrou depois
Que as intimidades todas foram expostas
Feito cortes de gado no açougue dos dias?
O que sobrou depois
Dos valores soterrados na avalanche de impulsos
Ejaculados precocemente no calor da ira?
O que sobrou depois
De toda a humanidade ter vindo à tona
Pedindo por socorro na superfície turva
E revolta da rotina?
***
Parada
sob todos os sóis de todos os dias
em meio a fumaça que contrasta
o azul que tremula
sobre o asfalto fervente
um braço acena ao cometa
que o transporta aos trancos
para o que dizem descanso
num lar incompleto
entre rastros verdes e azuis
letreiros pingados de laranja
exibem os destinos de milhares de vidas
comprimidos entre corpos
barras de ferro e trocados
o cansaço parece sólido
***
Sou um colapso
sou um colapso
um acelerador de partículas
indesejáveis
e de desejos incontroláveis
uma máquina do tempo
que não passa
um tuíte perdido
num canavial de inutilidades
digitais do terceiro milênio
um like dado com desdém
e repleto de terceiras intenções
um recado na caixa postal
da sua vida
a mensagem que visualizas
mas não respondes
sou um colapso
um cataclismo
uma chuva de granizo
uma lágrima
perdida no vazio
***
Da despedida
Não há luz
Que preencha o breu
Deixado por notas
Que não ressoam mais
Músicas tristes
Sentimentos engarrafados
Como vinhos avinagrados
Todas as despedidas são ácidas
Corroendo o tecido dos dias
Feito traças famintas
Úlceras queimando o estômago
A dor da saudade é física
Aldo Jr. é poeta, músico e boêmio. Escreve desde os quinze anos e tem 3 livros publicados: “O que silencia” (2014, Alternativa Books), “A moça com olhos de sessão da tarde” (2016, Editora Penalux) e o recém lançado "Os dias são laranjas apodrecidas rolando a ladeira" (2017, Editora Patuá). Aos 33 anos de idade ainda acredita que os versos sejam a melhor forma de comunicação de quem nunca se sentiu a vontade para se comunicar.