Mesmo ao meu lado
às vezes estás distante
Mesmo ao meu lado
às vezes perto demais
É sempre insuficiente
o tanto que te aproximas
Foto Ivam Martins | Modelo Floren de Bas
Literatura | Poesia | Ivam Martins de Matins
Ivam
Martins de Martins
“Palavras são pássaros incandescentes, saem por minha garganta, regurgitadas como sementes, que brotam como uma planta.”
Há inúmeras formas de expor o que sentimos e, foi por meio da poesia que Ivam assumiu aos 22 anos “as coisas que queria botar para fora e sentia e sua relação com os outros”. Constrói poesias compostas em versos (livres e/ou providos de rima), com associações harmoniosas de palavras, ritmos e imagens. O poeta penetra a parte mais ínfima da poesia que é “o quanto se aproxima de sua existência e dos amores vividos intensamente". Poeta, apaixonante, “risca em sua poesia como diamante palavras de amor e revolução no tempo e espaço”.
É SEMPRE INSUFICIENTE
O TANTO QUE TE APROXIMAS
(À Floren de Bas)
Mesmo ao meu lado
às vezes estás distante
Mesmo ao meu lado
Às vezes perto demais
É sempre insuficiente
O tanto que te aproximas.
Mesmo ao meu lado
És quem desejo amante
Mesmo ao meu lado
És quem arranca meus ais.
É sempre insuficiente
O tanto que te aproximas.
O tanto que te aproximas
Me é sempre esperança!
***
SOMOS
Sou a escova que roça teus cabelos
Sou o chão em que deitas teu corpo
Sou tuas mãos que me afagam
Sou teus dedos que me adentram
Sou o espelho que reflete tua imagem
Sou tua boca que profere verdades
Sou teus olhos que encaram os meus
Sou as contradições que mudam meu viver
Sou os conselhos que trocamos e que
Seguimos ou não
Sou a roupa que despe tua imagem
A grama que toca tuas pernas
O lençol que guarda nossos humores
O sofá que apoia nossos joelhos
Quando nos tocamos com prazer lento
Ou com uma violência permitida
A água do mar ou da lagoa que lava teu ventre
Sou teu prazer ao tocares teu corpo
E minha boca ao espreitar teu sexo
Sou teus lábios quando encontras os meus
E quando de dentro de mim sais
Sou a liberdade que me dás
E o receio de ser demais
Sou o medo de que te vás
E o desejo que sempre permaneças
Sou tua mulher e teu homem
Sou tudo isso
E nada ao mesmo tempo
Fugaz e eterno
Um hoje sem amanhã.
***
O MUNDO É MUITO MAIOR QUE UM
Mesmo com toda dor do mundo em ti
Ela não vai passar...
Ainda que muitos saiam de si
Ela não vai passar
O mundo é muito maior que um
Essa dor de cada um em ti
Não vai passar com rum
Não vai passar em Parati.
Essa dor em ti de todos
Só vai passar um dia
Quando todos a sentirem
E em suas próprias mãos
Suas vidas assumirem.
***
TRISTEZA
Queria mudar o mundo para ti
Para que te sintas mais à vontade
Todo sofrimento, toda dor
Toda beleza que há em ti
Doem em mim e me matam
Pouco a pouco.
Não sei se serei esteio suficiente
Para reproduzir o que buscas
Mas te juro companheira amada!
Que em cada passo que dou
Tentarei estar ciente
Do mundo em que lutas.
Queria mudar quase tudo por ti
Guardo em mim o que te amou
Pois nele encontro forças
Para mudar um pouco a cada dia
A mim, aos outros, ao mundo
A tudo que em ti doía
Enquanto ao meu lado ainda sofras.
***
SONO
Três horas da manhã
Queria me levantar
Mas o calor do teu corpo junto ao meu
Me diz que lá fora a tristeza ronda
Tua respiração no centro das minhas costas
Me diz que não posso me mexer.
Qualquer movimento meu
Poderia quebrar a segurança que sinto
Em ter tuas mãos em minhas ancas postas
Qualquer movimento meu
Te tiraria desse sono
E te devolveria ao mundo lá fora
Tenho medo que ele te fira
Que meu corpo perca o calor do teu
E tua respiração cesse de súbito.
***
ONDE FORES SEMPRE VOLTARÁS A MIM
Não importa...
Não importa...
Estamos tanto hoje um no outro
Que não importa.
Não importa
A distância que tivermos amanhã
Quando precisares de carinho
Onde fores sempre poderás voltar a mim
Não importa...
Não importa
Estarmos longe um no outro
Não importa
A dor que sentires amanhã.
Quando precisares de um ninho
Onde fores sempre estarás em mim
Não importa...
Não importa.
***
CORPO QUE PE(N)SA
Carrego em mim
Tudo de todos que passaram
Em minha vida
Sou um pouco composto
Dos que em meu corpo estiveram:
Braços, gestos, olhares, não-ditos
Bocas, lábios, sabores, cheiros
Vaginas, pés, peles, humores
Dedos, ânus, palavras, gritos
Seios, coxas, Pênis, poros
Pelos, pernas, cores
São o que em mim realizaram
Sou o que em mim encontraram.
***
ONDE ME ENCONTRO
No âmago mais frio da galáxia
Mas este calor súbito
Que percorre meu corpo
Não é capaz de diminuir nem um pouco
A imobilidade de meus membros
Onde me encontro
No mais escuros do meu ser
E nem teu olhar que me invade
É capaz de iluminar meu caminho
Queria trocar os meus olhos com o teus
E poder me ver como te vejo
Onde me encontro
No mais profundo de ti
E nem teus movimentos
Que tentam me fazer viver
São capazes de me afastar de mim
E me devolver ao teu desejo.
***
QUEM?
Quem terá a coragem
De percorrer o que se passa aqui
Dentro de mim?
Quem?
Quem será o ser que
Prescutará meus infindos segredos
Sem nem eu mesmo perceber?
Quem?
Quem será aquele que
Ao tocar meu corpo
Terá minha alma toda em suas mãos
Quem?
Quem se atreverá
A soltar os demônios
Que pululam loucos em minha cabeça?
Quem?
***
TEMPO
Só o tempo é capaz de devorar
Pedaço a pedaço o amor que sentimos
Nem o esquecimento pode apagar
A memória dos momentos que vivemos
Não sou capaz de olvidar
Cada uma das palavras que tua boca proferiu
Basta alguém uma delas pronunciar
Para que estejas toda inteira de volta na dor que me feriu.
O que virá depois não sei
Meu corpo te carrega em cada fibra
Lembrando o amor que te dei
Cada fio de cabelo teu em mim vibra
Em cada poema que se fez lei
Em cada dia que minha vida contigo celebra.
***
NADA
A miséria dos ricos
A miséria dos de baixo
A miséria da caridade
A miséria onde não me encaixo
A miséria da cidade
A miséria das favelas
A miséria
Ah! A miséria...
Nunca uma palavra teve tantos significados
Para os que sofrem a dor da fome
Para aqueles que recriam pecados
Para outros que bendizem teu nome
E roubam seus irmãos com descaramento
Nunca uma palavra foi tão desvalorizada
Uns a dizem sem nenhum sentimento
Outros por ela a cada dia, o nada.
***
MEDO
“Não sei fingir que amo pouco, quando em mim ama tudo”
Vergilio Ferreira
Tenho medo que desapareças
Que aos poucos como fumaça
Te vás!
Eu fique aqui tentando pegar
Cada raminho de vapor
Que se desmancha no ar.
Essa solidão as vezes a dois
Me dói!
Não sei o que fazer para que voltes
Nem sei se isso será possível um dia.
Quando não estiveres mais aqui,
Será a minha vez de desaparecer
E não estarás comigo
Para tentar me recompor.
E já não serei mais nada.
E não seremos mais nada.
Esse absoluto frágil
Se rompe e se reconstitui
A todo momento.
Quando estás já não estás
Quando penso que fostes
Estás de volta.
Cada sonho, cada coisa, cada pensamento,
Cada música, cada livro, cada poema
Te faz desaparecer
E voltar...
Meu corpo treme a cada mudança
De teu estado
Tão efêmera e tão concreta
Só o teu corpo me dá certeza
De que estás comigo.
Quando estou nele sei que vives.