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Literatura | Poesia | Nil Kremer
Nil Kremer
toda migração é desterro
gera cacos
pede rejunte
toda migração é cicatriz
rasgo raso
profundo corte
toda migração é mergulho
mil léguas de apneia
âncora fora do prumo
toda migração é tiro no escuro
alvo sem norte
recorte e colagem
toda migração é travessia
mais de uma via
mudança de faixa
toda migração é corredeira
naufrágio, onda inteira
mar revolto
a linha se rompe
num ponto qualquer
e deixa de existir nó
laços deixam de existir
e a linha já é fiapo
outra coisa qualquer
diferente do que foi
mantém a cor
a textura se mantém
mas a resistência da linha
não há, não tem
dos ritos todos
o rompimento da linha
é um tornado
nas coisas que não sei
tem as que sinto
sinto tanto
chispas bailando ao redor
maremotos e super novas
peito bordado de elos
música beliscando suave
teus olhos arpões
atravessando minha íris
pra acomodar furacão
há de ter mãos, braços, caixa toráxica
traços de magnetismo
e abismo em pó de pirlimpimpim
há de ser um tanto aventureiro
curtir terreiro com cheiro de atabaque
conhaque e tequila
há de ter quilos de paz e outros mais de inquietude
que mude como os ventos
que regue toda forma de vida
há de soprar gentileza pra estalar feito beijo
há de abraçar o fluxo do que lambe o peito
há de ter defeitos, bonitos defeitos
pra acomodar furacão
há de saber escutar e falar carícias
há de mover milícias
ah, meu bem
no mais, dedos ágeis e língua afiada
mais nada
Nil Kremer é atriz e arte educadora, com formação em Letras pela UCS.
Participou de coletâneas de poemas (publicações impressas e digitais), tem poemas publicados no livro da Tribo, em fanzines e revistas (digitais e impressas). Publicou o livro independente e artesanal “Kamikaze” (Da Gaveta,2016).